Bernardo Gavina apresenta hoje, 1 de novembro, Sobre o Amor ou a Última Dança, disco de estreia sob o pseudónimo BALANÇA. O músico dos Panda e os Caricas abandona o universo infantil para explorar territórios onde pop acústico, electrónica experimental e outras influências se cruzam em oito faixas que oscilam entre pop acústico e ambientes eletrónicos. Depois de 13 anos e mais de 20 discos gravados para públicos infanto-juvenis, o actor e compositor de 30 anos revela uma identidade sonora inesperada, marcada por camadas vocais ora simples, ora processadas, arranjos que crescem em intensidade e uma recusa deliberada da fórmula pop convencional, ao mesmo tempo que a abraça. Fica “Morena” em baixo, o single escolhido para este lançamento.
Quatro canções que definem o território
Foram-nos enviados 4 temas: “Morena”, o single, e “Ladainha do Queixume”, “Dança” e “Paraíso”.
“Morena“, o single destacado e que ocupa a terceira posição na sequência do disco, confirma-se como um dos momentos mais conseguidos de BALANÇA. Palmas batidas anunciam a entrada da voz, seguidas por guitarra que desenha acordes de origem inequivocamente brasileira. A bateria pontua com prsença, sem pressa, enquanto o que parece ser um clarinete adiciona textura melódica. O piano surge no refrão, momento em que a composição deriva para jazz sem abandonar completamente a bossa nova que a sustenta. É um piscar de olho à brasileiridade que nunca descamba em imitação servil.
Dos quatro temas aquele que sem dúvida se destacou pela diferença foi “Paraíso“, que encerra o disco em território completamente distinto. A voz chega processada por vocoder, apoiada em baixo profundo e pads ambientes que afastam definitivamente qualquer reminiscência acústica. A construção é paciente: camadas vão-se acumulando, um sintetizador em arpeggio adiciona movimento hipnótico, até que uma bateria electrónica – talvez demasiado comprimida, certamente intencional – explode e empurra o tema para o clímax. Tudo se desvanece depois em reverb e ambientes sintéticos, deixando o ouvinte suspenso numa tranquilidade conquistada por via da saturação.

Dos outros temas enviados, “Ladainha do Queixume” abre o álbum de forma elegante. O tema arranca acústico, voz limpa sobre guitarra e piano ao fundo, até que duas explosões sonoras rasgam a tranquilidade e empurram a composição para território rock. A tensão constrói-se sobre progressões em Mi maior que derivam inesperadamente para Fá ou Fá diminuto, numa escolha harmónica pouco óbvia que adiciona desconforto exactamente onde o ouvido esperaria resolução. A voz acompanha estas erupções com intensidade controlada antes de regressar ao verso inicial, criando um ciclo bonito de falsa segurança.
“Dança” ocupa a quinta posição e funciona como ponte directa entre o Bernardo dos Panda e os Caricas e o BALANÇA que procura autonomia. O cavaquinho acústico comanda um tema solar que inevitavelmente acaba por remeter para “Somewhere Over the Rainbow” do havaiano Israel Kamakawiwoʻole, mas não por cópia, sim pela forma como usa o instrumento para criar leveza imediata. O coro de crianças no fundo acaba por ser um piscar de olhos a anos a compor para públicos infantis, que deixaram marcas impossíveis de apagar. Em vez de as esconder, BALANÇA integra-as como parte consciente do seu vocabulário.
Álbum que recusa linearidade
Do que ouvimos, “Sobre o Amor ou a Última Dança ” é um álbum diferenciado. Sente-se Pop, com uma abordagem própria forte, e na recusa em escolher um território e nele permanecer. Não há aqui a segurança do disco acústico coerente nem a rigidez do trabalho electrónico que pode parecer demasiado “quadrado”. BALANÇA habita a tensão entre estes pólos sem tentar resolvê-la, e vai onde quer.
Esta oscilação manifesta-se não apenas entre faixas mas dentro delas. “Ladainha do Queixume“ demonstra-o de forma exemplar: o que começa intimista pode a qualquer momento explodir. É uma inquietude que atravessa todo o trabalho, como se o compositor não confiasse (ou não quisesse) que um único registo baste para comunicar o que pretende.
As influências brasileiras surgem sem pose. BALANÇA não está a fazer disco de bossa nova nem a tentar convencer-nos de que cresceu no Rio de Janeiro. Usa esses elementos como vocabulário disponível, da mesma forma que recorre a vocoders ou a coros infantis. Tudo funciona como paleta cromática ao serviço de composições que procuram, acima de tudo, movimento.
Bernardos múltiplos: do teatro ao estúdio
Nascido em 1994, Bernardo Gavina construiu trajectória que atravessa palcos, ecrãs e estúdios. Licenciou-se pela Escola Superior de Teatro e Cinema, completou o curso profissional na Academia Contemporânea do Espectáculo e tirou um pós graduamento em Dramaturgia e Argumento pela ESMAE. No teatro trabalhou com encenadores como Paulo Matos, David Pountney, Nuno Cardoso, Filipe La Féria e João Paulo Costa, entre outros nomes nacionais e internacionais.

A dobragem tornou-se paralela inevitável. Emprestou voz a Pokémon, The Amazing World of Gumball, Skylanders e SpyKids, desenvolvendo controlo vocal que agora se manifesta nas camadas de “Sobre o Amor ou a Última Dança“. Na televisão participou em Chiquititas (SIC), séries para RTP e trabalhos para TVI. A locução estendeu-se a Continente, Hyundai, Worten, BurgerKing e outras marcas.
Mas foi nos Panda e os Caricas, desde 2012, que estabeleceu a relação mais duradoura com o público. A banda infantil de maior sucesso em Portugal levou-o a gravar dezenas de temas que estabeleceram recordes de vendas e streams.
BALANÇA não nega este percurso. Aceita-o, digere-o, transforma-o. O coro infantil em “Dança” funciona como aceno a quem o acompanha há anos, mas também como declaração: é possível carregar essas memórias sem ficar refém delas.
Pseudónimo como manifesto
A escolha do nome BALANÇA não é arbitrária. Remete simultaneamente para movimento físico e para instabilidade emocional. É um verbo que tanto pode significar dançar como oscilar, tanto pode indicar alegria como (des)equilíbrio. Esta ambiguidade atravessa o disco inteiro.
O título Sobre o Amor ou a Última Dança reforça esta dualidade. Não sabemos se estamos perante celebração ou despedida, se o amor permanece ou se a dança que resta é precisamente aquela que antecede o fim. A conjunção “ou” funciona como suspensão: não há certezas, apenas possibilidades que coexistem.
Transição sem pedidos de desculpa
Sobre o Amor ou a Última Dança funciona como declaração de independência artística que não renuncia ao passado. BALANÇA não está a fazer disco de ruptura nem a tentar apagar os anos nos Panda e os Caricas. Está, isso sim, a demonstrar que é possível carregar múltiplas identidades sem que nenhuma anule as outras, eventualmente à procura de si próprio.
A aposta em sonoridades díspares, do acústico brasileiro ao vocoder electrónico, do coro infantil à bateria comprimida, poderia resultar em frankenstein sonoro. Mas há um fio condutor que tudo une: a recusa da estabilidade, a aceitação do movimento como condição natural. Cada faixa balança entre registos, cada composição oscila entre géneros, e é precisamente nessa instabilidade que o disco encontra identidade.
Resta saber se o público que cresceu com “Leopoldina” está disposto a seguir Bernardo Gavina até ao “Paraíso”, ou se BALANÇA encontrará audiências completamente novas. Talvez ambas as coisas aconteçam. Talvez seja esse, afinal, o ponto: não escolher, apenas balançar. Sobre o Amor ou a Última Dança chegou hoje às plataformas digitais. O álbum reúne oito faixas e está disponível em Spotify, Apple Music, YouTube Music e restantes serviços de streaming.
Instagram: @balanca_musica_
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