Quando cinco músicos de Leiria unidos sobre o nome First Breath After Coma e um lisboeta chamado Salvador Sobral se fecharam numa casa em Pombal durante duas semanas, ninguém sabia exatamente o que iria nascer dali. Não havia repertório preparado, nem canções pré-definidas. Apenas vontade de criar do zero e a certeza de que algo genuíno poderia emergir dessa convivência intensa. O resultado dessa experiência é “A Residência”, espetáculo que chega ao Teatro Maria Matos nos dias 13 e 14 de janeiro de 2026. Podes (e deves) ver o teaser em baixo, promete!
“A Residência”: Da Casa Varela para Lisboa
O projeto-espetáculo “A Residência” nasceu em novembro de 2024, quando os First Breath After Coma e Salvador Sobral aceitaram o desafio lançado pela Casa Varela, no âmbito do 4ª Parede em Pombal. Durante catorze dias, os seis músicos viveram um processo criativo sem rede: compor, arranjar e ensaiar temas completamente novos, partindo do silêncio para a canção. A residência culminou em dois concertos esgotados no Teatro-Cine de Pombal, confirmando que ali tinha acontecido algo especial.
Agora, meses depois, esse trabalho ganha nova vida no palco do Maria Matos. Mas não se trata apenas de replicar os concertos de Pombal. “A Residência” propõe-se recriar a atmosfera daquelas duas semanas: a intimidade da sala de ensaios, a energia de quem descobre sons juntos pela primeira vez, o convívio que transforma estranhos em cúmplices. É uma tentativa de transportar o público para dentro daquele processo, mostrando-lhe não apenas as canções, mas também o espírito que as gerou.

First Breath After Coma e Salvador Sobral em Novembro de 2024
Liberdade criativa sem moldes
Salvador Sobral descreveu a experiência como “uma experiência de liberdade criativa que não tinha sentido antes”. Apesar da sua carreira consolidada e do reconhecimento internacional que ganhou desde a vitória na Eurovisão em 2017, este projeto colocou-o num território diferente. Não se tratava de trabalhar a sua voz enquanto intérprete principal, mas de dissolver-se num coletivo onde todos partilhavam o mesmo peso criativo.
Roberto Caetano, vocalista dos First Breath After Coma, admitiu que Salvador Sobral se integrou de forma tão natural que rapidamente deixou de ser “o convidado” para se tornar “um dos nossos“. Essa fusão não foi forçada nem planeada, aconteceu organicamente no dia a dia da criação partilhada. Os First Breath After Coma, conhecidos pela sua sonoridade cinematográfica e pela forma como constroem paisagens sonoras expansivas no habitat do post rock, encontraram em Salvador Sobral uma sensibilidade melódica complementar, enquanto ele descobriu na banda um espaço para explorar texturas e atmosferas diferentes das que habitualmente habita.
Post-rock dos First Breath After Coma encontra intimismo vocal de Salvador Sobral
A discografia dos First Breath After Coma sempre se caracterizou por uma abordagem visual à música. Álbuns como “NU”, lançado em 2017, ou “Drifter”, nomeado para Álbum Independente Europeu do Ano pela IMPALA, mostram uma banda que pensa o som como narrativa. Não admira, portanto, que a residência tenha ganho contornos quase teatrais. O espetáculo não se limita a apresentar canções: encena o processo, materializa a convivência, dá corpo à experiência.
Salvador Sobral, por seu lado, sempre demonstrou apetite por colaborações e projetos que fugissem ao formato mais convencional da carreira a solo. Desde Alexander Search aos Noko Woi, passando por trabalhos com a irmã Luísa Sobral, o cantautor tem mantido uma postura inquieta, recusando acomodar-se numa fórmula. “A Residência” inscreve-se nessa linha: é mais um capítulo de uma carreira construída pela curiosidade e pela recusa do previsível.

“A Residência”: Mais do que dois concertos
Os espetáculos no Maria Matos marcam um novo momento para este encontro artístico, mas não o seu final. Os músicos estão a preparar a edição de um disco que prolongará a vida deste projeto para além do palco. Ainda sem data definida, o álbum promete capturar a essência daquilo que foi criado em Pombal, funcionando como documento e como obra autónoma.
Para quem acompanha a trajetória dos First Breath After Coma, desde os palcos do Paredes de Coura e Primavera Sound até festivais europeus como Reeperbahn e Eurosonic, este projeto representa mais uma prova da versatilidade e ambição da banda. Para quem segue Salvador Sobral desde “Amar pelos dois” até aos álbuns mais recentes como “bpm” e “SAL”, é mais uma confirmação de que o cantor se sente mais confortável nos territórios indefinidos do que nas zonas seguras.
O que esperar de “A Residência”
Quem for ao Maria Matos não vai assistir a um concerto tradicional. Vai entrar numa sala de ensaios ampliada, onde os músicos partilham o mesmo espaço simbólico e onde as hierarquias se diluem. As canções nascidas em Pombal ganham agora uma segunda camada de significado: já não são apenas o resultado de uma experiência, mas a memória viva dela, reencenada todas as noites.
É raro vermos projetos que assumem o processo criativo como matéria artística. “A Residência” faz exatamente isso: celebra o caminho tanto quanto o destino, a convivência tanto quanto a música. Num tempo em que a pressa domina a indústria musical, este espetáculo propõe algo radicalmente oposto. Devagar, junto do zero, é onde as explosões acontecem. E esta não vais querer perder de certeza!
Instagram First Breath After Coma: @_firstbreathaftercoma_ | Instagram Salvador Sobral: @salvadorsobral.music | Instagram Casa Varela: @casavarelapombal
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